Os trabalhadores informais, que são aqueles sem carteira assinada ou empreendedores sem registro, formam o grupo que deve ser mais afetado com o avanço da pandemia no Brasil.

Por Weruska Goeking, Valor Investe — São Paulo

23/03/2020

Os impactos econômicos do coronavírus têm levado à derrocada das bolsas de valores em todo o mundo, que já antecipam os efeitos devastadores da nova doença. Já no curto prazo, de imediato, para sermos mais precisos, são os trabalhadores informais — aqueles sem carteira assinada ou empreendedores sem registro — aqueles que devem ser mais afetados com o avanço da pandemia no Brasil.

Esses profissionais representam 41,1% da força de trabalho ocupada no país, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com a quarentena impondo o fechamento de comércios em todo o país e empresas permitindo o trabalho remoto, prestadores de serviços estão vendo sua fonte de renda ruir.

Na tentativa de ajudar esses trabalhadores a passar por essa crise de saúde e econômica sem o risco de “quebrar” seus negócios ou de reduzir sua renda, o Valor Investe buscou dicas com especialistas do que fazer quando o mundo está entrando em quarentena.

Confira:

Não se desespere

Pode soar simplista e óbvio, mas é fácil perder a cabeça quando sua fonte de sustento corre risco.

“O desespero não vai pagar suas contas. Se desesperar não vai fazer os negócios acontecerem nem trazer clientes”, afirma a estrategista de carreira e negócios Ell Branco, que recomenda cuidado ainda maior com as notícias falsas, que podem induzir a decisões erradas.

Não conte com a ajuda do governo para salvar o seu negócio

No âmbito nacional, o governo vem anunciando uma série de medidas para atenuar o baque financeiro para autônomos e pequenos empresários. O pacote de benefícios soma R$ 147,3 bilhões e inclui antecipação do 13° salário de aposentados e pensionistas, antecipação do abono salarial, adiamento de pagamento de impostos do Simples Nacional (micro, pequena e média empresa) de três meses.

O colchão para aliviar o sofrimento econômico é importante, mas o autônomo não pode baixar a guarda. “Quando o empreendedor vê essas notícias pode achar que está em uma situação confortável, mas dependendo do segmento em que ele atua pode ter problemas em dezembro, que é quando as pessoas usam o 13º para as compras de fim de ano, e também no pagamento de impostos depois. Essas medidas podem trazer consequências piores depois”, alerta a estrategista.

Assim, se mal aproveitado o estímulo agora, o profissional – especialmente aquele ligado ao comércio – pode sofrer no fim do ano.

Aproveite a quarentena para se planejar

Uma das maiores dificuldades do pequeno empreendedor e de trabalhadores autônomos é o planejamento e essa pode ser a principal razão para a “quebra” de alguns deles durante essa crise. “A maior parte dos empreendedores não está preparada para esse tipo de adversidade. A questão hoje é de saúde, mas uma lanchonete, por exemplo, em qualquer momento estaria sujeita a ter um problema de fiação e ter que fechar por um tempo, por exemplo”, conta a estrategista.

Os especialistas do Sebrae também alertam que é importante estar atento às mudanças dos hábitos de consumo, que hoje são causadas pela crise, mas podem ocorrer ao longo dos anos de forma menos abrupta.

Trace cenários – e se prepare para eles

A estrategista de carreira e negócios Ell Branco explica que o autônomo ou pequeno empresário deve fazer uma avaliação do cenário geral – do país e do setor em que atua – e interno – o seu trabalho – e buscar entender como a pandemia como impactá-lo.

Para o Sebrae, é fundamental o planejamento de cenários para entender as implicações financeiras e operacionais caso a crise se estenda por um período prolongado. “Sabemos que menos de 30 dias não vai durar, então é preciso pensar nas possibilidades”, diz a estrategista. O autônomo ou pequeno empreendedor deve traçar estimativas para três períodos principais:

  • Cenário 1 – crise de 30 dias
  • Cenário 2 – crise de 45 dias
  • Cenário 3 – crise de 60 dias

A recomendação principal para todos os casos é: CORTE CUSTOS.

Para cada um desses períodos, a estrategista recomenda que o profissional liste as contas que precisará pagar e as receitas que eventualmente ainda tem para receber — mesmo para quem deixou de faturar por causa da paralisação, pagamentos parcelados ainda podem estar por vir.

Outra possibilidade é checar os serviços que trazem maior rentabilidade ao negócio e a possibilidade de mantê-los mesmo durante a quarentena.

Foi o que fez Diego Lehder, dono de uma escola de dança em Fortaleza, que está usando tecnologia e redes sociais para manter um relacionamento próximo com os cerca de 170 alunos e evitar cancelamentos de matrícula. Diego também usa plataformas de videoconferência para transmitir as aulas e manter a interação com os alunos.

Essa é uma boa saída, segundo a estrategista, que recomenda aos profissionais que listem as ferramentas que possam gerar vendas mesmo durante a quarentena. “Depois das listagens, ele deve partir para o cruzamento dos cenários e se adequar a isso”, diz Ell Branco.

Essa adequação ao novo cenário também pode ser dividida em táticas. A primeira delas é destinada a quem já tinha um planejamento para crises, mas está preocupado com o fluxo das próximas semanas.

“Essas pessoas devem minimizar os custos. O dinheiro que sobrar vira receita para um possível cenário dois”, explica a estrategista.

tática 2 vale especialmente para os autônomos e os empreendedores que já cortaram os seus custos ao máximo: saiba o quanto precisa para sobreviver. Não é viver, é sobreviver.

“É preciso verificar o mínimo necessário para a sobrevivência. Estamos falando de um cenário de crise, e na crise a questão é de sobrevivência”, destaca a estrategista.

tática 3 é para quem não tem – mesmo – como gerar receita durante a quarentena, está devendo e não tem como pagar.

Além de minimizar todos os custos – algo que já deveria ter sido feito antes da crise para não estar vivendo no limite -, é hora de partir para a negociação de dívidas.

É o que a costureira Werli Braz de Mendonça pretende fazer com os donos dos dois espaços em que ela mantém ateliês em São Paulo e paga aluguel. “Nesse atual cenário de crise é a hora de ligar e partir para as técnicas de renegociação”, apoia Ell Branco.

O Sebrae também listou dicas específicas para alguns setores.

Confira:

Para quem trabalha com alimentação fora de casa

  • Reforce a importância de seguir os procedimentos de higiene na cozinha, no salão e no escritório;
  • Reduza em um terço a quantidade de mesas e estabeleça uma distância entre as mesas de 2 metros;
  • Aumente a prática da entrega direta por delivery ou incentive o consumidor a encomendar e buscar no restaurante;
  • Negocie com aplicativos de delivery a redução da cobrança de taxa;
  • Busque fontes alternativas de suprimentos, com diversificação de fornecedores preferencialmente locais;
  • Preste atenção no prolongamento dos prazos de entrega para avaliar o desempenho e a capacidade de acordo com as promessas do fornecedor e entrega ao cliente;

Para quem trabalha com serviços de beleza

  • Não faça demissões nesse primeiro momento para não perder empregados já preparados e não assumir custos com demissão. Se for necessário, antecipar as férias pode ser uma alternativa;
  • Promova a venda delivery de cosméticos, elaborando kits de produtos que atendam às necessidades das clientes. Melhor ainda se forem personalizados, conforme histórico de procedimentos já realizados no salão;

Para quem trabalha com feiras livres

  • Faça um planejamento emergencial de modo que você possa trabalhar com delivery, mesmo que de forma temporária;
  • Planeje com seus fornecedores alternativas de abastecimento no caso da paralisação das atividades dos centros de abastecimento;
  • Adote uma política de atendimento direto ao cliente via telefone ou Whatsapp;

Para quem trabalha com transporte, incluindo motoristas de aplicativo

  • Limpe e desinfete seu veículo. Preste atenção especial às superfícies com as quais você e os usuários entram em contato frequentemente;
  • Mantenha as janelas do automóvel abertas para fazer o ar circular melhor;

Para quem trabalha com serviços educacionais

  • Substitua excepcionalmente as aulas presenciais por virtuais, tendo como apoio o uso de ferramentas tecnológicas. Sugere-se, inclusive, que esta opção de atendimento ao aluno seja contabilizada como atividade letiva;
  • Para as escolas que não têm plataforma de ensino à distância, deve-se analisar a possibilidade de uso em caráter emergencial;

Para quem trabalha com turismo

  • Aproveite o momento de baixa para fazer melhorias na infraestrutura;
  • Defina política de cancelamento e adiamento das reservas dos serviços;
  • Tente negociar com o cliente para que a viagem seja adiada, mas não cancelada;

Fonte: Valor Investe

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